No primeiro trimestre de 2025, o mercado de capitais brasileiro surpreendeu ao atingir um recorde histórico de captação, totalizando R$ 152,3 bilhões. Deste montante, impressionantes 96,3% foram obtidos por meio de instrumentos de renda fixa, com as debêntures liderando as emissões, que alcançaram R$ 103,08 bilhões, um novo marco para o período. A análise da ANBIMA (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) destaca ainda a crescimento das debêntures incentivadas e a participação das pessoas físicas no mercado de crédito privado.
As debêntures incentivadas, regidas pela Lei 12.431/11, representaram 45% das emissões, resultado notável comparado aos 12% registrados no mesmo período de 2023. Esta mudança sinaliza um crescente interesse por investimentos que oferecem isenção de Imposto de Renda, especialmente entre os investidores individuais.
Camilla Dolle, head de renda fixa da XP, observa que, apesar de as debêntures simples ainda dominarem o mercado, a crescente atratividade das emissões isentas pode levar a uma diminuição da participação das primeiras. Essas debêntures incentivadas costumam financiar grandes projetos de infraestrutura, o que também explica o aumento nas emissões.
A participação das pessoas físicas no mercado primário de debêntures foi de apenas 1,9% no primeiro trimestre de 2025. No entanto, essa demografia demonstra uma presença mais significativa no mercado secundário, uma vez que muitas ofertas de debêntures são restritas a investidores qualificados ou profissionais.
Um relatório da B3, referente ao quarto trimestre de 2024, indica que há mais pessoas físicas investindo no crédito privado do que em ações, com 4 milhões de CPFs no crédito privado em comparação a 3,9 milhões nas ações. A diferença de valor em custódia é ainda mais acentuada: R$ 1,25 trilhão na renda fixa contra R$ 347,7 bilhões em ações.
Para Dolle, a isenção de Imposto de Renda torna os instrumentos incentivados mais atraentes, especialmente em um cenário de juros altos e volatilidade no mercado acionário. Lucas Drummond, head de securitização da Opea, afirma que a participação de investidores individuais no crédito privado está crescendo devido a condições macroeconômicas favoráveis, como a Selic em alta.
A ascensão dos investidores individuais coincide com uma diminuição da participação do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) no mercado, especialmente em ativos ligados a infraestrutura. Essa mudança reflete um maior interesse do varejo em debêntures, CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários) e CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio).
Para aumentar ainda mais a participação das pessoas físicas nesses instrumentos, Dolle enfatiza a importância da educação financeira. Muitos investidores podem estar mais familiarizados com ações do que com crédito privado, o que pode criar uma hesitação em entrar nesse mercado. Ela ressalta que diferentes níveis de risco nos investimentos em crédito privado tornam a categoria adequada para diversos perfis de investidores.
Apesar de os casos de recuperação judicial de empresas como Americanas e Light, que abalaram o mercado de crédito em 2023, ainda estarem na memória dos investidores, Dolle acredita que estas situações já não influenciam as decisões de investimento. Ela observa que os spreads das debêntures vêm caindo nos últimos meses, indicando uma forte demanda por papéis de renda fixa com taxas atrativas.
Em relação à estratégia de investimento, a XP recomenda evitar a concentração em apenas um emissor, limitando a participação da dívida de uma única empresa a no máximo 5% do portfólio total.