Um ditado popular norte-americano resume bem a situação política em muitos casos: “Você tem que fazer o que é necessário”. Essa expressão explica as mudanças inesperadas no comportamento de líderes políticos, especialmente presidentes dos Estados Unidos. Pesquisas de historiadores e cientistas políticos tentam entender o que molda essa dinâmica de liderança, apontando três fatores que interagem entre si.
O primeiro fator são os recursos institucionais, tanto formais quanto informais. Isso se refere às regras estabelecidas pela Constituição e à cultura política do país. Esses elementos definem as oportunidades e os limites que os líderes enfrentam em suas gestões. Por exemplo, nos Estados Unidos, os presidentes precisam da aprovação do Senado para nomear os principais membros de seu gabinete, enquanto na Argentina, essa decisão pode ser tomada através de um decreto. Em algumas culturas, os presidentes são vistos quase como figuras divinas. No México, por exemplo, ainda existe uma tradição em que os principais líderes da política e da sociedade civil beijam a mão do presidente durante a apresentação do relatório presidencial.
O segundo fator são as características individuais do líder, como personalidade, experiência, valores, inteligência emocional, flexibilidade, resiliência e carisma. Cada presidente é único, e sua trajetória pessoal e profissional influencia fortemente a qualidade de suas decisões.
O terceiro fator é o contexto histórico. Cada situação política, tanto local quanto internacional, é única e pode favorecer ou prejudicar os líderes. A história mostra como a sorte pode ser um elemento decisivo no sucesso ou fracasso de uma gestão. Por exemplo, como teria sido a administração de Fernando de la Rúa se ele tivesse se beneficiado do aumento nas exportações que outros presidentes desfrutaram? Essa questão ilustra como o ambiente impacta a capacidade de liderança.
Os presidentes enfrentam desafios complexos, onde precisam equilibrar o que é possível, o que devem e o que desejam fazer. Muitas vezes, o que é possível e necessário prevalece sobre os desejos. Assim, eles chegam ao poder com agendas ambiciosas, mas logo precisam focar em objetivos mais imediatos e práticos. Em contraposição, alguns líderes que apresentam programas mais modestos podem enfrentar circunstâncias extraordinárias que exigem uma resposta diferente.
Javier Milei, o atual presidente, chegou ao poder em meio a uma expressiva insatisfação popular com a política tradicional, clamando por uma mudança radical. Após um recente triunfo eleitoral, ele se viu mais legitimado, o que lhe dá mais força para negociar com governadores e outros atores políticos. Um senador que apoia suas reformas comentou que agora Milei se apresenta com mais confiança nas articulações políticas.
Normalmente, os presidentes mantêm os estilos que utilizaram durante as campanhas. No entanto, à medida que o trabalho de governar exige habilidades diferentes, muitos passam por uma adaptação ao longo do tempo. Milei reconheceu que teve um “aprendizado forçado” após uma derrota e agora busca formas de negociar e encontrar pontos em comum para avançar em suas propostas. Um importante cientista político americano apontou que ele começou a se comportar de maneira mais presidencial.
Além disso, a percepção do governo como fraco e cercado de conspirações mudou após seu recente sucesso nas urnas e a boa reação dos mercados. A expectativa é que essa nova fase de relacionamento com os governadores e outros aliados resulte em um modelo de “presidencialismo de coalizão”, semelhante ao que foi desenvolvido no Brasil, onde presidentes sem maiorias no parlamento conseguiram juntar apoio necessário para implementar suas agendas.
Dessa forma, um número ainda a ser definido de governadores e legisladores se torna crucial para a criação de um sistema de cooperação que antes Milei hesitava em aceitar. Essa negociação implica compartilhar o poder e abrir o gabinete, o que envolve ceder controle em um governo democrático.
O principal desafio para Milei é fazer essa transição mantendo sua imagem de candidato transformador. Ele precisa manter seu suporte popular, que inclui a expressão e o estilo que o tornaram popular, evitando uma mudança brusca de comportamento que poderia aliená-lo de seus apoiadores. Portanto, a flexibilidade e a capacidade de adaptação são fundamentais para o sucesso de sua administração. Milei tem a oportunidade de deixar sua marca na história, desde que consiga equilibrar as exigências do cargo com o apoio popular que conquistou. Essa habilidade de adaptação será determinante para que ele não caia na armadilha da rigidez em um cenário político em constante mudança.

