A ampliação da isenção do Imposto de Renda (IR) para salários de até R$ 5 mil mensais pode não ter o impacto esperado na demanda e, consequentemente, na inflação. Segundo economistas consultados pelo Broadcast, essa questão envolve uma análise mais complexa, considerando fatores como a valorização do câmbio, o alto nível de endividamento das famílias e a capacidade ociosa da indústria.
Igor Rocha, economista-chefe da Federação da Indústria do Estado de São Paulo (Fiesp), argumenta que a proposta deve ser considerada dentro de um contexto de reforma tributária, interpretando a isenção como um avanço em termos de justiça fiscal. Ele destaca que, embora a isenção possa aquecer a economia, o efeito mais significativo na sua perspectiva é causado pela valorização do câmbio que, mesmo em um cenário de baixo desemprego, está proporcionando uma desaceleração da inflação.
De acordo com Rocha, o fortalecimento do real em relação ao dólar está ajudando a controlar as pressões inflacionárias. Ele salienta que o Brasil mantém um dos maiores diferenciais de juros do mundo, o que tem contribuído para essa valorização. “O efeito cambial tem um peso maior do que as questões relacionadas à demanda na redução da inflação”, avalia.
Outra preocupação levantada por Rocha é o elevado endividamento das famílias. O economista e fundador da André Perfeito Consultoria Econômica, André Perfeito, também aponta que, mesmo com um aumento na massa salarial, a relação entre a isenção e o crescimento da demanda pode não se concretizar como previsto. “As famílias estão alavancadas e isso pode limitar a transformação de renda em consumo”, diz.
Ambos os economistas concordam que mesmo com um excedente de recursos disponíveis, a indústria pode sempre ajustar sua oferta. A Fiesp indica que a Utilização da Capacidade Instalada (Nuci) na indústria de transformação de São Paulo está em 79,4%, enquanto no setor de máquinas e equipamentos o Nuci atingiu 78,8%, indicando uma ociosidade significativa.
As últimas estatísticas da indústria de máquinas e equipamentos mostram uma queda de 2,5% na carteira de pedidos em agosto, uma tendência que reflete a recuperação setorial ainda frágil. No entanto, a ociosidade pode permitir que o setor responda a uma eventual demanda adicional sem pressão inflacionária significativa.
Rocha também expressa cautela sobre as expectativas de aumento geral na demanda. “O mercado de trabalho ainda é muito apertado, e isso pode limitar qualquer impacto positivo da isenção no poder aquisitivo real”, afirma. O Sensor da indústria paulista, que registrou 49,6 pontos em setembro, ainda sinaliza contração da atividade, apesar do ligeiro aumento em relação ao mês anterior.
Por essas razões, Rocha acredita que o Banco Central deve manter sua postura de cautela, aguardando a efetivação dos efeitos das recentes políticas monetárias antes de considerar alterações em sua estratégia. A percepção do cenário econômico atual sugere um controle contínuo, sem movimentos abruptos no horizonte das políticas monetárias.