Em um momento de crescente discussão sobre a propriedade de dados, Brittany Kaiser, ex-consultora da Cambridge Analytica, defende um novo modelo de economia digital que oferece aos cidadãos direitos reais sobre suas informações pessoais. Durante uma entrevista ao InfoMoney, Kaiser destacou a importância de uma remuneração justa pelo uso desses dados, além do foco atual na privacidade.
“Embora a privacidade seja essencial para manter os dados em sigilo, é justo que aqueles que optam por compartilhá-los recebam uma parte da receita gerada”, afirmou. Kaiser, reconhecida por expor irregularidades na coleta de dados durante o escândalo da Cambridge Analytica, argumenta que o cidadão digital deve ser compensado pelo consentimento dado ao uso de suas informações.
O escândalo de 2018 expôs que a Cambridge Analytica coletou dados de até 87 milhões de usuários do Facebook sem o consentimento adequado, utilizando essas informações para criar perfis psicográficos que influenciaram campanhas políticas, como a eleição de Donald Trump em 2016 e o referendo do Brexit.
Kaiser, que trabalhou como diretora de desenvolvimento de negócios na Cambridge Analytica, desempenhou um papel crucial ao documentar e denunciar as práticas da empresa. Sua colaboração com o Parlamento do Reino Unido foi vital para aumentar a conscientização sobre a privacidade de dados e estimular legisladores em diferentes países.
Desde 2018, a conscientização sobre a exploração de dados cresceu, mas Kaiser observa que a estrutura de coleta e uso de dados permanece inalterada. “As pessoas continuam consentindo, mas o tratamento dos dados não mudou. Todos agora reconhecem que seus dados têm valor”, destaca.
A especialista critica a eficácia das multas aplicadas a grandes empresas de tecnologia e propõe a necessidade de um novo mecanismo que trate os dados pessoais como propriedade.
Projeto-piloto no Brasil
Recentemente, um conceito inovador começou a ganhar destaque no Brasil, por meio de uma parceria entre a Dataprev e a empresa americana DrumWave, da qual Kaiser é conselheira. Este projeto foi anunciado durante o Web Summit Rio e propõe a criação de uma “conta poupança de dados”, permitindo que os cidadãos tenham controle sobre suas informações digitais e monetizem esse uso.
A ideia é transformar dados pessoais em ativos econômicos, com potencial para gerar renda através de sua utilização em tecnologias como inteligência artificial. Os responsáveis pelo projeto também pretendem introduzir mecanismos de juros compostos e criar opçõe de renda mínima digital.
“Esta iniciativa corrige um desequilíbrio histórico na economia digital”, afirmou Kaiser, acrescentando que visa promover justiça econômica e fortalecer os direitos humanos digitais no século XXI.
Rodrigo Assumpção, presidente da Dataprev, classificou a ação como um “passo relevante rumo à equidade digital” e ressaltou que o reconhecimento dos dados como propriedade pertencente ao cidadão é crucial para esse processo. Embora o projeto esteja em sua fase inicial, há expectativas de que ele estabeleça um modelo legal e operacional para a gestão de dados pessoais no Brasil, consolidando o país como referência em direitos digitais.