BUENOS AIRES (Reuters) – Christian Bialogurski, professor de comunicação de 35 anos, enfrenta a dura realidade econômica da Argentina, dedicando até 12 horas diárias ao trabalho sem garantir uma alimentação adequada. Seu salário mensal, que em um mês favorável chega a US$ 450, é insuficiente para cobrir as despesas básicas, como aluguel e transporte, resultando em situações em que ele depende da ajuda da mãe para se alimentar.
“Não é suficiente. Às vezes, eu peço comida à minha mãe. Você tem que suportar a fome”, lamenta Bialogurski em sua casa no subúrbio de Loma Hermosa, na região metropolitana de Buenos Aires.
As recentes políticas implementadas pelo presidente Javier Milei visam estabilizar a economia argentina, impactada por uma inflação elevada. Em sua gestão, Milei conseguiu reduzir a inflação, suspender os controles monetários e até gerar o primeiro superávit orçamentário em 14 anos. Apesar das aclamações pelos resultados, muitos argentinos enfrentam dificuldades para se adaptar a esse novo cenário.
Os cortes de gastos do governo têm prejudicado setores essenciais, como pensões e infraestrutura. Funcionários públicos, incluindo professores, sofreram com a diminuição de seus salários, que caíram mais de 15% em termos reais após a ascensão de Milei ao poder, em dezembro de 2023, conforme relata a consultoria CTA Autónoma.
Contrariamente, os trabalhadores do setor privado estão vendo seus salários superarem a inflação, com um aumento real de cerca de 3,3% no mesmo período. Julieta Battaglia, contadora de 43 anos, expressa essa nova realidade: “Os salários não são suficientes, mas a queda da inflação traz mais previsibilidade em relação às despesas. Agora, pelo menos, os preços não aumentam toda semana.”
Aumento da Informalidade e Vulnerabilidade Econômica
O início do governo Milei foi marcado por um aumento do desemprego e da pobreza, embora essas taxas tenham mostrado sinais de melhora à medida que o país se recupera da recessão. No entanto, a taxa de desemprego terminou o último ano em 6,4%, ligeiramente acima do que era quando Milei assumiu o cargo.
Estudos do think-tank IPyPP indicam que o número de trabalhadores autônomos aumentou, criando um grande grupo de trabalhadores sem seguridade social e, portanto, mais vulneráveis. Em entrevista, Roxana Maurizio, pesquisadora da Conicet, observou que trabalhadores informais recebem cerca de 41% a menos do que seus colegas formais no mesmo setor, destacando que “ter um emprego não é um seguro contra a pobreza”.
Esse enfraquecimento do mercado de trabalho contribuiu para uma queda acentuada de mais de 10% no consumo nos supermercados durante o último ano, segundo dados oficiais, e gerou frequentes protestos contra a austeridade econômica. Agustín Salvia, especialista em pobreza da Universidade Católica da Argentina, afirma que o desemprego real pode ser muito mais alto, chegando a 30% se considerarmos os empregos temporários sem seguridade social.
Embora o Ministério do Trabalho tenha se abstido de comentar, a administração Milei permanece firme em sua posição de que o ajuste fiscal é crucial e que a melhoria na inflação resultará em salários mais justos. Para os aposentados, os cortes nos gastos têm sido ainda mais impactantes. Em protestos recentes, Ricardo Bouche, um aposentado de 69 anos, expressou seu desespero: “Minha pensão de 270.000 pesos (US$ 251) não é suficiente para comprar carne ou pagar os serviços públicos. Fiz uma cirurgia de câncer de próstata e não consigo nem mesmo comprar meus remédios.”