Enquanto o Congresso Nacional debatia a Medida Provisória 1.303/25, houve uma movimentação significativa no mercado financeiro. Investidores buscaram ativos que, conforme a proposta original, perderiam a isenção de Imposto de Renda a partir de 2026. Em resposta, empresas apressaram suas emissões, resultando em setembro no segundo melhor desempenho mensal da indústria de fundos, com captação líquida de R$ 20,1 bilhões. Essa alta foi impulsionada principalmente pelos fundos de crédito privado, que reabriram para captação.
No entanto, a aprovação de uma MP simplificada pelo Congresso, na quarta-feira (8), garantiu a manutenção da isenção de debêntures incentivadas, Letras de Crédito Imobiliário (LCIs), Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs). A corrida por ativos isentos acabou demonstrando-se desnecessária, mas deixou sua marca no mercado: a demanda elevada colocou pressão nos prêmios, que começaram a recuar. O Bradesco BBI reportou que o spread médio das debêntures incentivadas com classificação AAA encerrou setembro com -40 pontos-base sobre as NTN-Bs (Tesouro IPCA+).
Essa dinâmica resultou em um cenário em que uma debênture incentivada, cuja rentabilidade média era de IPCA + 6,75% ao ano, apresentava rendimentos inferiores aos oferecidos pelo Tesouro IPCA+ 2040, que pagava juros reais de 7,15%. Apesar da movimentação, os emissores se beneficiaram, logrando emitir dívida a custos mais baixos, com prêmios mais vantajosos do que os oferecidos por títulos do Tesouro Nacional. “Dificilmente uma empresa se arrependerá de ter antecipado uma emissão”, afirma Leonardo Ono, sócio e gestor de crédito da Legacy.
A emissão de debêntures incentivadas atingiu R$ 8,5 bilhões em agosto, configurando o maior volume para o mês desde 2019, segundo a Anbima (Associação Brasileira dos Mercados Financeiro e de Capitais). A demanda por essas emissões foi robusta, resultando no fechamento dos spreads. Ono enfatiza que muitos fundos reabriram para captação, capitalizando essa corrida, o que contribuiu para a diminuição dos spreads.
O principal fundo da Legacy, com patrimônio líquido de R$ 2,5 bilhões, deve ser encerrado na próxima semana. A estratégia do fundo foi antecipar compras a partir de junho, prevendo a redução dos spreads, uma expectativa que está se concretizando. “Acredito que os prêmios continuarão a cair um pouco mais até dezembro”, afirma Ono.
Em relação à sustentabilidade dessa demanda, Marcelo Peixoto, gestor de crédito privado da Trígono Capital, acredita que, mesmo com spreads negativos, os fundos de crédito privado não enfrentarão resgates. “A permanência da isenção torna a debênture incentivada um investimento ainda bastante vantajoso”, afirma.
Sobre a disputa entre LCIs, LCAs e debêntures, Ono analisa que essas letras representam uma concorrência significativa para os fundos. Ele sugere que a tributação dessas letras poderia equilibrar a competição, pois atualmente elas oferecem uma vantagem tributária em relação às debêntures.
Outro aspecto relevante da MP 1.303/25 é a implementação da alíquota única de 18% de Imposto de Renda, que substitui a tabela regressiva anterior. Antes, investidores que mantinham aplicações por dois anos ou mais se beneficiavam de uma alíquota reduzida de 15%, iniciando em 22,5% para aplicações de até seis meses.
Peixoto critica essa mudança, argumentando que desestimula investidores de longo prazo. Segundo ele, a nova alíquota única pode diminuir a permanência dos investidores em ativos, levando a uma maior rotação nas carteiras. Ono expressa preocupação com a possibilidade de os investidores optarem por títulos de menor prazo, o que pode dificultar a manutenção de uma dívida pública de prazo mais longo.
Por fim, Peixoto considera que o impacto da Medida Provisória sobre o crédito privado é neutro devido à manutenção das isenções para ativos incentivados. A principal alteração efetiva está na nova alíquota, que influencia diretamente a decisão do investidor em relação à permanência em ativos.