A proposta de permitir o pagamento do vale-refeição (VR) e vale-alimentação (VA) por meio do Pix enfrentou resistência e foi rapidamente descartada pelo governo. Embora a ideia tenha surgido a partir da iniciativa do setor econômico, com o intuito de mitigar os efeitos da inflação dos alimentos, preocupações sobre a possível desvinculação do benefício levaram o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) a descartar a proposta. Neste momento, o foco do governo está na redução das taxas cobradas pelas operadoras.
Conforme apontado pela Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT), as taxas podem variar de 3,5% a 8%, sendo estabelecidas livremente pelas operadoras. Contudo, esse custo recai sobre os comerciantes, não sendo percebido diretamente pelos trabalhadores no ato da compra.
Em declaração ao InfoMoney, o diretor-presidente da ABBT, Lúcio Capelletto, ressalta que a taxa permanece constante independentemente das variações inflacionárias. Portanto, embora os preços dos produtos possam aumentar, o percentual da taxa continua o mesmo, resultando em maiores custos para restaurantes e supermercados.
“Não faz o mínimo sentido pensar que a taxa esteja impactando a inflação dos alimentos. Os trabalhadores pagam pelos produtos que consomem, sem acréscimos pelo uso do VR ou VA.”
Riscos e Consequências da Alteração na Forma de Pagamento
A ABBT, que representa 95% das empresas do setor, alerta que uma mudança na forma de pagamento poderia colocar em risco o Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). A proposta de pagamento direto ao trabalhador poderia desestimular empregadores, especialmente pequenas empresas, a oferecerem o benefício. Capelletto destaca que a extinção do PAT deixaria 23 milhões de brasileiros desamparados.
Ele menciona ainda que, ao receber a quantia em dinheiro, os beneficiários poderiam utilizá-la para fins não alimentícios, entrando em conflito com a proposta original do programa. Segundo Diego Gonçalves, advogado trabalhista, a alteração proposta desrespeitaria a Lei 6.321/76, que exige que o vale-refeição seja destinado a estabelecimentos alimentícios.
Para viabilizar os pagamentos por Pix, seria necessário um ajuste legal que identificasse claramente o valor em espécie como não integrável ao salário. Segundo Gonçalves, o modelo deveria seguir diretrizes semelhantes às do vale-transporte, que estabelece regras claras e limita a natureza salarial desses benefícios.
Implicações Financeiras e Tributárias
Especialistas afirmam que o pagamento do VR e VA via Pix poderia convertê-los em salário in natura, gerando impactos significativos em encargos trabalhistas, previdenciários e tributários. Gonçalves chama atenção para a possibilidade de reflexos em férias, 13º salário e FGTS, uma vez que benefícios pagos dessa forma podem ser considerados como parte da remuneração, conforme a legislação trabalhista.
Ademais, ao serem pagos em dinheiro, esses benefícios estariam sujeitos à tributação, afetando a renda líquida dos trabalhadores. Sérgio Pelcerman, sócio da área trabalhista de um escritório de advocacia, menciona que a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) define que valores pagos de maneira habitual, sem controle de uso, são considerados como parte do salário.
Taxas das Operadoras e Alternativas para o PAT
Os debates em torno do PAT ganharam força devido ao aumento da inflação dos alimentos. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) apontou um fechamento em 2024 de 4,83%, com uma alta acumulada de 5,48% até abril de 2025. A meta inflacionária para 2025 é de apenas 3%, elevando assim a pressão sobre o governo por soluções mais eficazes.
A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) propôs que o PAT fosse gerido diretamente pelo governo, utilizando contas-salário. Estimativas indicam que essa mudança poderia gerar uma economia de R$ 10 bilhões por ano, transferindo custos que impactam cerca de 22 milhões de beneficiários.
“As taxas atualmente pagas pelas empresas empregadoras e estabelecimentos afiliados, superando 15% do valor transacionado, encarecem os produtos e afetam diretamente os beneficiários do PAT.”
Entretanto, a ABBT defende que essas taxas são essenciais para cobrir os custos de credenciamento e fiscalização dos estabelecimentos. Recentemente, o MTE anunciou uma nova proposta que foca na redução do prazo de repasse das quantias aos comerciantes, de 30 para apenas 2 dias, além da padronização das taxas com um teto estabelecido entre 3% e 4%.
A ABBT se declarou disposta a discutir a redução das taxas, visando um aprimoramento contínuo. Contudo, segundo Capelletto, a associação não foi consultada sobre as novas discussões em torno do pagamento do benefício ou sobre a possível redução das taxas.