Apesar de ser frequentemente considerado um "ouro digital", o Bitcoin (BTC) tem demonstrado um comportamento mais semelhante ao de ativos de risco ao longo de sua história, acompanhando o movimento das bolsas em períodos de estresse financeiro. No entanto, indicadores recentes sugerem uma possível mudança nesse padrão.
Nos últimos dias, em um contexto de queda nas ações e crescente tensão devido à guerra comercial e declarações do ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, o preço do Bitcoin ultrapassou a marca de US$ 94 mil, com um aumento de aproximadamente 12% em apenas quatro dias, conforme dados da CoinGecko. Este movimento ocorreu paralelamente a quedas acentuadas dos índices S&P 500 e Nasdaq.
Essa valorização coincide com a pressão pública exercida por Trump sobre Jerome Powell, presidente do Federal Reserve, gerando temor sobre a potencial interferência no banco central mais influente do mundo. Em resposta a esse cenário instável, investidores têm se voltado para ativos considerados mais seguros, como o ouro e, de forma crescente, o próprio Bitcoin. A gestora 21Shares observa que o comportamento do BTC se alinha mais ao do ouro, visto a valorização de ambos em meio à instabilidade do mercado financeiro.
O analista Karim Nabil, da 21Shares, destaca que "o Bitcoin está sendo negociado mais como ouro digital do que como uma ação de tecnologia". Ele pontua que a busca por ativos descentralizados se intensificou em função do aumento da incerteza política em relação ao Federal Reserve e ao avanço da guerra comercial.
Dados da QCP Capital indicam que a narrativa do Bitcoin como proteção contra inflação e volatilidade se fortaleceu após as recentes quedas nos mercados de ações. "Se essa dinâmica persistir, pode impulsionar a alocação institucional em BTC", afirma a empresa em seu relatório. A tendência também é evidenciada por fluxos recordes em ETFs de Bitcoin nos EUA, que registraram cerca de US$ 1 bilhão em entradas líquidas em um único dia, em 22 de abril, sinalizando um crescente interesse dos investidores institucionais.
O desempenho atual do Bitcoin contrasta com ciclos anteriores de tensão entre Trump e o Federal Reserve, como o observado em 2019, quando a criptomoeda caiu juntamente com as ações. A diferença desta vez, segundo Nabil, está no crescimento do mercado cripto e na disponibilidade de produtos como ETFs que facilitam o acesso ao ativo pelos investidores institucionais.
Nabil ainda observa que a recente confrontação de Trump com o Fed destaca a fragilidade dos sistemas monetários centralizados, ressaltando a atratividade do Bitcoin como uma alternativa que não está sujeita a políticas inflacionárias de governos e bancos centrais. A desvalorização do dólar nesse período também contribuiu para o aumento do apelo por ativos escassos, como o ouro e o Bitcoin. O analista menciona que "com o dólar em seu menor nível em três anos, a busca por proteção contra a erosão do poder de compra aumentou".
Por outro lado, analistas como Jake Ostrovskis, da Wintersmute, alertam que essa desconexão do Bitcoin em relação às ações pode ser temporária. Em uma comunicação com clientes, ele apontou que a fraqueza do dólar provavelmente é o principal motor desse fenômeno, sugerindo que a correlação entre Bitcoin e ações pode se restabelecer com a estabilização da moeda americana.
Na manhã de 24 de outubro, o Bitcoin apresentava uma leve queda, cotado a US$ 92.459, seguindo o desempenho dos futuros de Nova York, após a China negar qualquer diálogo com os Estados Unidos sobre tarifas impostas por Trump. Embora a criptomoeda tenha registrado um trimestre desafiador, acumula uma alta de 9,5% nos últimos sete dias.