O ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kenneth Rogoff, previu nesta segunda-feira, 29, que o dólar deve experimentar uma queda de “no mínimo entre 5% e 10%” nos próximos dois ou três anos. O especialista fez a afirmação durante evento do Itaú BBA realizado em São Paulo.
Atualmente professor em Harvard, Rogoff destacou que a trajetória futura do dólar é complexa de prever, mas apontou uma anomalia na análise de câmbio tradicional: quando uma moeda está distante de seu poder de compra, como acredita ser o caso do dólar hoje. “Os Estados Unidos estão no centro da inteligência artificial, o que proporciona um aumento significativo na produtividade. No entanto, sou cético sobre a trajetória do dólar. Acredito que vai cair bastante nos próximos 2 ou 3 anos; a probabilidade é alta”, disse.
Rogoff, que liderou o FMI entre 2001 e 2003, relacionou a desvalorização do dólar às políticas do governo Donald Trump. “A administração Trump está trocando o soft power pelo hard power, adotando uma postura mais combativa. Vejo uma luta em defesa do dólar, mas, a meu ver, estão indo pelo caminho errado”, afirmou. Ele ressaltou que, embora a abordagem não seja novidade, a rapidez na implementação é impressionante. “O que ele fez em 7 ou 8 anos, outros tentariam realizar em 3 ou 4 anos. Isso é realmente chocante”, comentou sobre os dois mandatos de Trump.
Rogoff também mencionou que o ex-presidente declarou uma guerra econômica global e busca centralizar o poder no executivo. A seu ver, o dólar foi “colocado em um pedestal” após a Segunda Guerra Mundial, mas começou a perder participação como moeda de reserva a partir de 1970. “Cerca de 15 anos atrás, ninguém achava que o dólar chegaria a esse nível de dominância. Cinco anos depois, já estávamos pensando que a Europa ganharia mais força. Essas mudanças já estavam em curso antes de Trump”, analisou.
O economista prevê que a economia global está se movendo em direção a um sistema multipolar, com o euro se tornando uma alternativa viável, caso ocorra uma desestabilização nos Estados Unidos. Moedas asiáticas e criptomoedas também estão se tornando cada vez mais relevantes. Rogoff avaliou que, segundo suas estimativas e as do Banco Mundial, cerca de 20% ou mais da economia global já utiliza criptomoedas, indicando um espaço significativo para competição nesse mercado emergente.
Ainda segundo Rogoff, países continuarão a manter o dólar como moeda central, mas há um impulso crescente para revisar essa abordagem. Ele argumentou que países emergentes devem abraçar um sistema multipolar que transcenda as transações de comércio e impacte todos os aspectos dos negócios. A evolução da inteligência artificial contribui para essa transição. O Brasil, Índia, China e Europa estão entre as regiões que desenvolvem plataformas digitais independentes. “Estamos caminhando para um cenário onde os países não só não vão querer depender do dólar para transações, mas também não o usarão como base econômica”, alertou.
As stablecoins, moedas digitais que têm seu valor atrelado a ativos estáveis, como o dólar, estão se firmando na economia global. Rogoff as caracteriza como potencial concorrente das criptomoedas tradicionais e um substituto para cartões de débito e crédito. Ele enfatizou que as stablecoins representam uma fatia considerável da economia global, porém, a falta de regulamentação adequada levanta preocupações sobre auditoria e possíveis sonegações fiscais.