Os ministros Luis Felipe Salomão e Marco Aurélio Bellizze, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), apresentaram nesta quinta-feira uma proposta de atualização do Código Civil durante uma audiência pública no Senado. Essa iniciativa visa modernizar diversas normas que regem áreas como família, contratos, propriedade e sucessões, refletindo as necessidades atuais da sociedade brasileira.
Salomão e Bellizze foram, respectivamente, presidente e vice-presidente da comissão de juristas que elaborou o anteprojeto. O texto, que agora está em análise por uma comissão do Senado, representa uma importante atualização em relação ao Código Civil atual, que está vigente desde 2002. Esta audiência foi uma das primeiras atividades do grupo formado por senadores, que deve operar até março de 2026.
Durante a audiência, Salomão reforçou que o anteprojeto é resultado de um trabalho árduo, conduzido por renomados especialistas em direito civil. Ele expressou confiança de que os senadores irão aprovar um texto que atenda aos desafios da sociedade contemporânea. Segundo ele, o Código Civil é fundamental na vida das pessoas, regulando desde o nascimento até a morte, incluindo questões essenciais como casamentos e a administração de empresas.
O ministro também se posicionou diante das críticas à proposta, que incluem alegações de que ela conteria “absurdos”. Ele destacou que não é razoável acreditar que juristas reconhecidos apresentariam sugestões sem fundamento. Ele incentivou um debate saudável sobre as propostas, lembrando que a discordância é natural, mas deve ser pautada pelo respeito ao trabalho científico realizado.
Bellizze complementou que a missão do grupo de juristas foi cumprida e agora cabe ao Congresso Nacional deliberar sobre as mudanças. Ele enfatizou que o Legislativo deve estar atento à voz da sociedade, que é fundamental nesse processo de avaliação das propostas.
O anteprojeto em questão propõe a modificação ou revogação de 897 artigos do atual Código Civil, quase metade do total de 2.063 artigos existentes. Além disso, a proposta inclui mais de 200 novos dispositivos. Um dos objetivos é incorporar decisões judiciais importantes ao texto, como a legitimação da união homoafetiva, reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal em 2011.
Entre as mudanças propostas está a alteração no reconhecimento de paternidade. O novo texto sugere que o homem indicado pela mãe como pai de uma criança deverá registrá-la ou realizar um exame de DNA. Caso o suposto pai se recuse a colaborar, a norma prevê que seu nome deverá ser incluído no registro, com o envio de uma cópia da certidão ao mesmo.
Outra questão abordada no anteprojeto é a regulamentação da reprodução assistida, atualmente baseada em resoluções do Conselho Federal de Medicina e decisões judiciais. O texto sugere mudanças em tópicos sensíveis, como o anonimato de doadores e a reprodução após a morte, mantendo diretrizes existentes sobre a gestação por substituição.
Além disso, a proposta permite que uma criança nascida de um gameta doado anonimamente tenha acesso ao nome do pai biológico, através de autorização judicial, em situações de necessidade de informações relacionadas à saúde. Isso contrasta com a regra atual, que garante sigilo absoluto, exceto em casos específicos de doação entre familiares.
O projeto ainda introduz novos conceitos como “herança digital”, abordando a preservação da privacidade dos falecidos e estabelecendo responsabilidades dos pais em relação à atuação de seus filhos nas redes sociais. Nos últimos anos, as decisões dos tribunais sobre a transmissão de bens digitais entre herdeiros, em falta de uma legislação clara, destacaram a urgência de uma atualização. A proposta que tramita no Congresso define o que compõe a herança digital, incluindo senhas, dados financeiros, perfis em redes sociais e arquivos digitais que possuam valor econômico.