Em um cenário de juros elevados, a demanda por títulos isentos de impostos tem levado o crédito privado a níveis preocupantes, conforme análise de Marília Fontes, sócia-fundadora da Nord Investimentos. A especialista alerta que os spreads do setor estão em mínimas históricas, aumentando a exposição ao risco de eventos de crédito, como defaults e atrasos nos pagamentos, especialmente se a política econômica atual, que prioriza altos gastos e subsídios, continuar.
Fontes traça um panorama macroeconômico em que tanto o Brasil quanto os Estados Unidos enfrentam uma desaceleração econômica moderada, mas com rigidezes que impedem queda significativa nas taxas de juros. Essa situação compromete o acesso ao crédito e limita a capacidade de investimento das empresas, que enfrentam endividamento elevado.
A especialista observa que as gestoras de crédito privado têm registrado forte crescimento, em contraste com fundos de ações, refletindo o apetite dos investidores por esses ativos, mesmo em um contexto econômico desafiador. No entanto, se a taxa Selic permanecer alta, eventos de crédito, como os que afetaram empresas como Ambipar, Braskem, Lojas Americanas e Light, podem se tornar mais frequentes.
Desafios da Política Econômica
Segundo Fontes, a estratégia do governo tem sido oferecer subsídios e benefícios fiscais, especialmente em áreas como agronegócio e infraestrutura, na tentativa de estimular a economia. Essa abordagem de “pé no acelerador”, com altos gastos públicos, aliado a um “pé no freio” com juros altos, resulta em uma taxa neutra que desestimula o investimento produtivo em favor de aplicações em renda fixa.
A consequência disso é que as empresas se veem limitadas em suas operações, muitas vezes dependendo da concessão de subsídios estatais, enquanto um cenário de juros mais baixos beneficiaria um número maior de empresas.
Expectativas para os Juros
O cenário macroeconômico global não indica boas perspectivas para o crédito privado, que só se tornaria mais atrativo com a queda das taxas de juros, tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil. A diminuição das taxas americanas poderia facilitar reduções semelhantes no Brasil, mas há limites para essa dinâmica.
No caso dos EUA, a capacidade de corte está atrelada ao controle da inflação, que ainda sofre pressão devido a tarifas que não foram totalmente integradas à economia. A incerteza em torno dessas tarifas pode dificultar um retorno rápido da inflação ao alvo estabelecido, criando um “piso” para a queda dos juros.
Além disso, a elevada dívida pública dos EUA, que já chega a 7,5% do PIB, e a falta de planos claros para redução de gastos, elevam a pressão sobre os juros de longo prazo, que impactam, por sua vez, a taxa neutra. Essa situação é refletida no Brasil, onde um mercado de trabalho resiliente e baixos índices de desemprego também pressionam o Comitê de Política Econômica a manter juros elevados, limitando a possibilidade de cortes.
Fontes finaliza ressaltando que a taxa de juros brasileira está fortemente conectada às oscilações do mercado americano. Caso a taxa americana não diminua devido à dívida e ao desempenho econômico, o Brasil permanecerá enfrentando juros altos, em torno de 12%, pelo longo prazo.