A tramitação do Projeto de Lei 1.087, que introduz a tributação sobre lucros e dividendos, juntamente com as reformas estruturais propostas na Reforma Tributária, deve desestimular o uso do regime de Lucro Presumido. Especialistas consultados pelo InfoMoney apontam que essa mudança afetará principalmente empresas prestadoras de serviços, como escritórios de advocacia e clínicas de saúde, que tradicionalmente aproveitam a simplicidade e as alíquotas reduzidas deste modelo tributário.
Atualmente, o Lucro Presumido é acessível a empresas com faturamento anual de até R$ 78 milhões. Nesse regime, o governo estima uma margem de lucro sobre a receita bruta – que na maioria dos serviços é de 32% – e aplica as alíquotas de IRPJ (15%) e CSLL (9%). Essa estrutura oferece uma previsibilidade tributária, pois as empresas não precisam detalhar cada despesa para calcular o imposto, embora as de menor margem de lucro possam acabar pagando mais do que se estivessem no Lucro Real.
De acordo com Gabriela Miziara Jajah, sócia do escritório Siqueira Castro, a atratividade do Lucro Presumido já estava em queda antes das reformas, e o PL 1.087 tende a intensificar essa tendência. Segundo ela, com a nova tributação sobre dividendos, as vantagens anteriormente associadas a esse regime estão se dissipando. “O Lucro Presumido fazia mais sentido devido à sua simplicidade e à isenção na distribuição de lucros. Agora, isso mudou”, comenta.
Com a aprovação do projeto, dividendos que superarem R$ 50 mil mensais estarão sujeitos a uma taxa de 10%. Essa mudança impacta diretamente os sócios de empresas do Lucro Presumido que costumavam receber rendimentos isentos. Jajah alerta que as empresas de serviços, que enfrentam dificuldades para gerar créditos tributários, serão as mais afetadas. “As empresas terão que lidar com uma nova carga tributária sobre a receita e sobre os lucros distribuídos, levando muitas a reavaliar sua estrutura financeira para permanecer competitivas”, argumenta.
Impacto Indireto sobre o Lucro Presumido
Andrea Bazzo, sócia do escritório Mattos Filho, observa que o PL 1.087 encarece o Lucro Presumido sem modificações diretas a seu regime. “Intervir diretamente neste modelo seria politicamente arriscado. Com este projeto, a tributação de dividendos afeta o Lucro Presumido indiretamente”, avalia.
Segundo Bazzo, apesar de o projeto ter uma estrutura técnica sólida, sua motivação é eminentemente arrecadatória, sem uma análise abrangente do sistema tributário. “A nova norma, por si, não é ruim, mas a falta de uma visão holística é problemática”, critica.
Aumento da Carga Tributária
A Reforma Tributária projetada promete aumentar os lucros líquidos da indústria em até 10 pontos percentuais e do varejo em até 5 pontos. No entanto, para o setor de serviços, que historicamente paga menos PIS/Cofins e ISS, representa um aumento de complexidade e elevações nas alíquotas. O surgimento do IBS e da CBS, com alíquotas de referência em torno de 26,5%, pode levar empresas de serviços que anteriormente operavam com uma carga efetiva de 14% a ver essa taxa elevar-se para até 40%.
Com o PL 1.087, espera-se que a carga tributária aumente ainda mais. Jajah observa que esta reforma será “a cereja do bolo” em termos de oneração, resultando em custos adicionais tanto para o faturamento quanto para a renda pessoal devido à tributação sobre dividendos.
Reavaliação de Modelos de Tributação
Diante desse cenário, muitas empresas poderão se ver forçadas a reconsiderar seu regime tributário, especialmente aquelas que não conseguem suportar o peso da nova carga fiscal. A migração para o Lucro Real pode se tornar uma realidade. Bazzo ressalta que o PL poderá ainda incentivar uma reavaliação dos planejamentos societários, levando as empresas a repensar a distribuição de lucros e a possibilidade de reter mais resultados para reinvestimento.
Urgência de uma Reforma Aprofundada
As especialistas concordam que sem uma reforma tributária mais abrangente e coordenada, o novo modelo pode penalizar ainda mais aqueles que empregam no país. “Estamos adicionando complexidade e oneração às camadas já existentes. O Lucro Presumido está indo para a UTI”, resume Jajah. Bazzo complementa: “O PL 1.087 busca corrigir distorções, mas não considera o sistema como um todo, incluindo consumo, folha e renda, aumentando a pressão sobre os mesmos setores.”
Mecanismos para Redução da Dupla Tributação
Para evitar que a soma dos tributos pagos pela empresa e pelo acionista exceda os limites estabelecidos, o PL 1.087 introduz um mecanismo denominado “redutor”. Esse dispositivo beneficia o acionista ao reduzir o imposto sobre a renda pessoal, considerando o imposto já pago pela empresa, garantindo uma carga tributária total não superior a 34% para a maioria das empresas e até 45% para instituições financeiras.
Embora a proposta de equalização seja bem recebida, a eficácia do redutor pode ser limitada, pois poucas empresas alcançam a alíquota máxima de 34%.
Contexto Legislativo
O PL 1.087/2025, que foi aprovado pela Câmara e segue agora para análise do Senado, estabelece uma tributação mínima de 10% sobre lucros e dividendos distribuídos, com isenção para rendimentos de até R$ 50 mil mensais. Esta medida é parte do esforço do governo para aumentar a arrecadação e equalizar a carga tributária entre diferentes fontes de renda. O projeto também complementa as mudanças já implementadas na Reforma Tributária, que criam o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) a partir de 2027.
Outra Proposta em Foco
Além disso, no final de agosto, o Lucro Presumido foi alvo do Projeto de Lei Complementar 182 de 2025, do deputado José Guimarães (PT-CE), que propõe um aumento de 10% na taxação para empresas que faturam a partir de R$ 1,2 milhão ao ano. Essa proposta busca incrementar a arrecadação e é considerada essencial para atingir as metas fiscais de 2026.