O Brasil enfrenta a necessidade urgente de reformular elementos críticos do seu orçamento, como o regime dos Microempreendedores Individuais (MEI), a Previdência e os supersalários. A avaliação é de Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper, que alerta para uma possível crise fiscal em até dez anos se nada for feito.
De acordo com Mendes, o déficit causado pelo MEI, estimado em R$ 700 bilhões, representa uma ameaça significativa ao sistema previdenciário. Ele defende um conjunto de medidas rigorosas, que, embora desafiadoras em termos políticos, são fundamentais para estabilizar a dívida pública e aliviar a pressão sobre os juros.
“Se não resolvermos isso (MEI), vamos arrebentar a Previdência em dez anos.”
Ele sugere aumentar a contribuição dos MEIs, restringir benefícios e reinstaurar regras de correção do salário mínimo, além dos pisos constitucionais de saúde e educação de acordo com a inflação. Mendes também propõe a redução das emendas parlamentares, que atualmente alcançam níveis recordes, o que poderia resultar em uma economia de R$ 25 bilhões anuais.
Modificações na Previdência são igualmente necessárias, incluindo ajustes automáticos na idade mínima de acordo com a expectativa de vida, revisão de benefícios para militares e policiais, e a igualdade de tratamento entre homens e mulheres.
Embora esse pacote de medidas não traga resultados imediatos nas contas públicas, Mendes acredita que pode reduzir as expectativas de juros a longo prazo, alterando completamente a trajetória fiscal do país dentro de uma década. Esse alerta foi feito durante o podcast Outliers, do InfoMoney, apresentado por Clara Sodré e Fabiano Cintra.
Medidas Arrecadatórias e Suas Consequências
Mendes também comenta sobre medidas emergenciais, como o aumento do IOF, que, embora possam gerar fechamento temporário de caixa, evidenciam o risco de criar um sistema fiscal instável a longo prazo.
“Quando vai dando desespero, você começa a antecipar receita.”
Ele criticou a Receita Federal por sua tendência de reinterpretar normas em busca de arrecadação, o que pode gerar insegurança jurídica e a judicialização excessiva para as empresas. Mendes classifica como “receitas predatórias” iniciativas que dificultam a compensação de créditos tributários conquistados pela via judicial.
Embora tais ações possam elevar a arrecadação em curto prazo, elas comprometem a confiança no futuro e inibem os investimentos produtivos. Esse ambiente instável também força o Banco Central a manter juros elevados, dado que uma política fiscal expansionista pressiona a inflação.
“O Banco Central é o adulto na sala, segurando as pontas para não deixar a inflação disparar.”
Desafios Políticos para as Reformas
Em relação à viabilidade das reformas políticas, Mendes enfatiza que a resistência do Congresso, principalmente do Centrão, torna a implementação dessas mudanças ainda mais complexa. Segundo ele, mesmo que um novo governo seja eleito, a base no Congresso permanecerá a mesma, beneficiando-se das atuais políticas.
O pesquisador também ressalta que as dificuldades são mais do que apenas diagnósticos; tratam-se de interesses. Ele relembrou de seu livro, Por que o Brasil Cresce Pouco, onde argumenta que a baixa coesão social no país dificulta a construção de consensos necessários para reformas estruturais.
“Todo mundo tenta tirar o máximo do pote e colocar o mínimo possível. É um jogo de soma negativa, muito focado no curto prazo.”
Mendes conclui que a cultura política do Brasil mescla os interesses da elite, que historicamente depende de subsídios, com a pressão popular por aumento nos benefícios sociais, resultando em um orçamento que supera as capacidades do PIB.