BUENOS AIRES (Reuters) – A Lumilagro, tradicional fabricante de garrafas térmicas de aço e vidro, enfrenta sérios desafios em sua operação após décadas de sucesso. Os argentinos, que utilizam esses recipientes para transportar água quente para o mate, agora veem a empresa familiar, com mais de 80 anos de história, lutando contra a concorrência de importações mais baratas e o aumento dos custos de produção. O gerente comercial, Carlos Bender, informou que a companhia está importando a maior parte de seus produtos, com preços até 30% inferiores aos custos de produção local.
Em consequência, a Lumilagro fechou seu forno de vidro há 18 meses, mantém apenas uma de suas quatro linhas de montagem e reduziu sua equipe de 160 para 60 funcionários. Bender descreveu essa situação como um processo “muito doloroso”, observando que os armazéns da empresa estão quase vazios.
A situação enfrentada pela Lumilagro ilustra um problema maior na Argentina, que está passando por uma reforma econômica drástica sob a liderança do presidente Javier Milei. Sua agenda, promovida como uma estratégia para estabilizar a economia, gerou um superávit fiscal significativo, algo inédito em um país que historicamente lida com déficits. Contudo, essa desregulamentação também aumentou a competição de produtos importados e diminuiu o poder de compra dos consumidores locais.
Dados do Instituto Nacional de Estatística e Censos (Indec) revelaram que, em agosto, a produção industrial caiu 4,4% em relação ao ano anterior, e o desemprego nas zonas metropolitanas de Buenos Aires disparou para 9,8% no segundo trimestre, em comparação a 9,1% no mesmo período de 2022. Essa realidade está minando o apoio à coalizão de Milei, que já enfrentou uma derrota eleitoral nas eleições provinciais de Buenos Aires em setembro, em um momento crítico antes das eleições de meio de mandato.
Com a necessidade de aumentar sua representação no Congresso, o partido libertário de Milei busca viabilizar sua agenda de reformas de livre mercado, minimizando os gastos públicos e evitando propostas da oposição que podem comprometer suas metas. Desde a ascensão de Milei, a inflação acumulada em torno de 200% tem sido tratada por meio de cortes de gastos e altas taxas de juros, além de uma moeda local supervalorizada que tem incentivado um aumento nas importações, conforme analisam economistas.
NNOVAS DIFICULDADES PARA FABRICANTES
Outras empresas como a Ilva, produtora de cerâmica, também foram impactadas e forçadas a fechar suas instalações em Pilar, Buenos Aires, resultando em protestos de 300 ex-funcionários exigindo indenizações. Um dos demitidos, Juan González, declarou que as autoridades são as responsáveis pela crise da companhia, citando a queda constante nas vendas como causadora do colapso.
Apesar das dificuldades, setores como mineração e energia, especialmente em relação à formação de xisto de Vaca Muerta, surgem como pontos positivos no atual cenário econômico. No entanto, a pesquisa da Universidade de San Andrés revelou que a aprovação de Milei atingiu 39% em setembro, evidenciando o descontentamento da população com medidas de austeridade e escândalos envolvendo sua administração.
Em um contexto mais amplo, as eleições de 26 de outubro levarão os argentinos a escolher 127 deputados e 24 senadores, apresentando um teste definitivo para o futuro da agenda econômica de Milei. Enquanto isso, sua reunião recente com o ex-presidente dos EUA, Donald Trump, resultou em um acordo de US$20 bilhões em uma linha de swap cambial para a Argentina, uma tábua de salvação que dependerá da continuidade de sua administração e da exclusão dos peronistas do governo.
Um proprietário anônimo de uma fábrica de peças automotivas em Buenos Aires destacou que sua produção foi reduzida pela metade em função das altas taxas de importação, que oferecem produtos por preços 75% menores do que a fabricação local. Segundo Luis Campos, analista de emprego do sindicato CTA Autónoma, as políticas de Milei, embora tenham gerado alguma estabilidade, já mostram seus limites em relação à geração de empregos, especialmente em setores que não são intensivos em mão de obra.